O futebol profissional, o dinheiro, a ganância de determinados cartolas e o marketing derrotaram o esporte amador, o olimpismo, o tiro e o lazer dos associados do
Club de Regatas do Flamengo.
Flamengo Deseja Ampliar Estádio e Jogar em Casa
Desde 1991, Márcio Braga e seu diretor e braço-direito, Paulo Dantas, tratavam de achar uma solução para a constante falta de dinheiro do clube. O Flamengo não conseguia pagar sua enorme dívida. Seu carro-chefe, o futebol, pagava caro para mandar seus jogos no Maracanã ou para alugar outros estádios, como o estádio Mané Garrincha, em Brasília (DF).
No Rio de Janeiro, o clube nunca se sentiu à vontade para mandar suas partidas no Caio Martins, na Rua Bariri, em Moça Bonita ou no Ítalo Del Cima. A solução passou a ser a Gávea, que já recebia jogos do Campeonato Estadual contra os times pequenos desde o final dos anos 1980.
Em 1991, numa decisão surpreendente, a Confederação Brasileira de Futebol autorizou que o Urubu mandasse partidas do Campeonato Brasileiro no acanhado estádio da Gávea. Em 30 de março, o Flamengo perdeu para o Atlético (MG) por 3 a 1, mas abriu um precedente para receber Náutico (PE) e São Paulo (SP) em seus domínios.
Em seu pequeno alçapão, os cartolas logo perceberam que a receita das pelejas na Gávea pioraram ainda mais o resultado financeiro do clube. A única solução encontrada era a de pressionar o Governo Municipal que autorizasse a construção do estádio na Gávea.
Sócios se Dividem a Respeito dos Projetos
O sonho de todo flamenguista sempre foi a conclusão do estádio da Gávea. Apenas
um setor das arquibancadas de concreto foram construídas para a inauguração da sede do Flamengo. As arquibancadas provisórias de metal existiram ali nos anos 1940 e 1950, mas há muito tempo haviam desaparecido.
Endividado, o presidente Márcio Braga, e seu vice, Luiz Augusto Velloso, defendiam a colocação destas estruturas provisórias, que seria um investimento mais econômico até que o Flamengo saldasse sua enorme dívida.
Outro grupo de sócios defendia a construção de arquibancadas definitivas ao redor de todo o estádio da Gávea. George Helal liderou estes associados.
Ambos os projetos esbarravam em leis municipais que exigiam estacionamento em caso de grande público e o gabarito do Leblon que impedia grandes construções e grandes eventos ali.
Luiz Augusto Velloso Vence Eleição de 1993
Com 67% dos votos (2.268), Luiz Augusto Velloso derrotou George Helal (1.131 votos ou 33%) e assumiu a presidência do Flamengo para dar andamento aos projetos iniciados na gestão anterior.
Gestão Desastrosa
Sem dinheiro em caixa, sua gestão foi marcada pela venda de diversos jogadores pratas da casa campeões brasileiros de 1992 a preço de banana e pela desativação de diversos esportes olímpicos, como o handebol, a patinação artística e a ginástica rítmica.
Estádio e Marketing Como Soluções
Velloso apostava num marketing revolucionário para sanar as despesas do clube. Ele lançou uma raspadinha e renegociou o contrato de patrocínio da Petrobrás. A galinha dos ovos de ouro ainda era o estádio de futebol.
Demolição do Estande de Tiro
Velloso já vinha conversando com empresas especializadas na montagem de arquibancadas metálicas e tubulares desde a gestão anterior. Logo que assumiu a presidência, ele mandou limpar o terreno ao redor do campo de futebol, pois ali subiriam as arquibancadas metálicas o mais breve possível.
Não é que Velloso pretendia acabar com o estande de tiro ao alvo, que ele não gostasse de tiro esportivo ou algo parecido. A demolição do estande de tiro se deu porque sua localização era atrás do gol onde está o Jockey Club Brasileiro. Nas partidas de futebol da Gávea, as atividades de tiro eram interrompidas para os árbitros utilizarem os vestiários do estande. O estrutura do tiro impedia a instalação das arquibancadas atrás daquela baliza.
Despejo em 48 Horas
Os atiradores do Flamengo receberam a notícia da demolição com dois dias de antecedência. Eles precisavam esvaziar seus armários e retirar seus pertences. O administrador do bar também precisava retirar seu estoque, assim como o gerente do estande que vendia munição, camisas e equipamentos.
As escavadeiras rapidamente fizeram a ação de destruir o estande de tiro. Equipes de limpeza da clube e terceirizados ajudaram a retirar o entulho.
Ex-Ministro do Exército Lidera Rebelião
O General Leônidas Pires Gonçalves, ex-Ministro do Exército (1985 a 1990), que teve papel fundamental na redemocratização do Brasil, e que foi fundador do Polígono de Tiro da AMAN, liderou o movimento entre atiradores e sócios do Flamengo para tentar impedir a destruição do espaço de tiro rubro-negro. "O departamento pode ser transferido para outro lugar dentro do clube", alegou.
Obra Atrasa Mais de um Mês
A rebelião dos atiradores da Gávea contra a gestão de Luiz Augusto Velloso teve vários capítulos. Era Flamengo contra Flamengo na justiça. Os atiradores alegaram que um estádio de futebol na sede da Gávea daria um nó no trânsito na região, que já é bem escura e que havia problemas de segurança. Eles deram entrada numa liminar que foi cassada semanas depois pelo próprio corpo de advogados do clube.
Depois, os atletas procuraram o Corpo de Bombeiros e mostraram que as arquibancadas improvisadas não oferecia segurança em caso de grande público.
Num momento marcante, porém triste, após uma reunião com a presidência, o General Leônidas Pires Gonçalves, rasgou seu título de sócio do Flamengo e o deixou na mesa. No dia seguinte, ele se tornaria sócio do
Fluminense, pelo qual competiu nos anos seguintes.
Velloso Mente a Atiradores e Seduz Prefeito
Com as vitórias na justiça e o poderio financeiro que o futebol ofereceria à cidade, as obras seguiram em frente. Velloso mentiu aos atiradores que uma parte da renda dos jogos de futebol no Estádio da Gávea seriam reservadas e destinadas para a construção de um novo estande de tiro dentro do clube. Isso nunca aconteceu.
Ignorando todas as resoluções e leis municipais prévias, César Maia veio fazer seu marketing pessoal na Gávea e apoiar o novo estádio flamenguista. A prefeitura sonhava com uma enorme arrecadação de impostos com o futebol e shows musicais ali.
O estádio não seria exclusivo para o futebol. Ele seria também dos shows, como Natalie Cole, Oingo Boingo e INXS, que se apresentaram na Gávea.
Contrato Assinado com a Empresa Mills
A empresa Mills foi a responsável por instalar as arquibancadas de metal no entorno da Gávea. Ela não tem nada a ver com o imbróglio envolvendo a diretoria e os atiradores.
O curioso é que apesar de terem assinado o contrato, o novo número com a capacidade de público do Estádio da Gávea variava segundo o dirigente, segundo o dia, segundo o estado de ânimo daquele momento. Falou-se todos os números entre 16 e 30 mil torcedores. A realidade é que o estádio comportava cerca de 23 mil torcedores muito apertados. Os banheiros das novas arquibancadas eram os químicos e não haviam bares.
Flamengo Demora Quase Um Ano Para Inaugurar Estádio
No segundo semestre de 1993, o Flamengo chegou a anunciar que a obra duraria apenas vinte dias. Ela praticamente durou o restante do ano. O clube correu atrás de todas as licenças para poder inauturar sua "nova" arena. Por muito pouco não foi um show musical que estreou o Estádio José Bastos Padilha, novo nome do estádio da Gávea.
Alguns cartolas rubro-negros viajaram à Europa. Eles sonhavam trazer uma grande equipe para jogar com o Flamengo numa grande festa de inauguração da Gávea. Eles converaram com Real Madrid (Espanha), Milan (Itália) e Parma (Itália) mas não obtiveram sucesso.
Desastre na Estreia
Nenhuma grande equipe europeia veio prestigiar o Flamengo. Talvez elas soubessem do despejo dos atiradores. Quem veio foi uma equipe mediana, o Grasshoppers (Suíça).
Sem Júnior Baiano, vendido ao São Paulo (SP); Djalminha, vendido ao Guarani (SP); Piá, vendido ao Santos (SP); Renato Gaúcho, que acertou com o Atlético (MG) já que não teve seu contrato renovado; e Casagrande, que foi para o Corinthians (SP), pois tampouco teve seu vínculo renovado, o Flamengo foi presa fácil para os suíços e perdeu por 2 a 0.
Alguns Atiradores Seguiram no Flamengo
O Estande de Tiro da Gávea funcionou entre 1975 e 1993. A partir de 1993, os atiradores voltaram à situação pré-1975, onde eles deveriam procurar outros clubes para treinar mas poderiam competir pelo Flamengo. Como dissemos acima, o clube iria reconstruir o estande em outro local na Gávea.
Sendo assim, o Flamengo continuou filiado à Federação de Tiro Esportivo do Estado do Rio de Janeiro mais alguns anos. Aos poucos, eles foram minguando. A grande maioria foi para o Fluminense, outros abandonaram o esporte. O craque
Fábio Coelho, por exemplo, seguiu defendendo o time rubro-negro até 1995, quando se transferiu para o Clube de Caça e Tiro de Niterói.
O departamento de tiro do Flamengo chegou a ter 700 atletas em 1986!
Fracassou o Estádio da Gávea
Em 1995, foram treze pelejas: Madureira,
Campo Grande, Volta Redonda (duas vezes),
Friburguense, Americano, Sousa (PB), Entrerriense,
Bangu (duas), Gama (DF) e Kaburé (TO).
Em 1996, foram novo confrontos: Bangu, America (duas vezes), Madureira,
Americano,
Itaperuna, Barreira,
Olaria e Juventude (RS).
Em 1997, o número caiu para cinco partidas:
Volta Redonda, Americano (duas vezes), Madureira e Bangu.
No fim de 1997, as arquibancadas provisórias foram retiradas da Gávea. No lugar do antigo estande de tiro havia um amplo vazio. Esperava-se que o clube pudesse reconstruir a casa de seus atiradores. No entanto, o presidente Kléber Leite, para seduzir o craque Romário a voltar ao Flamengo, optou por construir ali uma quadra para futevôlei.
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